Hoje é dia de Caetano, pensou desde que acordou. Mas não qualquer Caetano. Não queria ouvir "êta-êta-êta... é a luz de Tieta". Não! Não queria saber de Tieta. Hoje é dia de Lindonéia. Não tinha muita certeza do porquê, mas, Lindonéia sempre o encantou. Achava que tinha relação com a voz da Nara Leão. Sempre achou a voz da Nara Leão atraente demais. Mas, Lindonéia era diferente das outras. É Caetano, pensou.
Pôs o disco para tocar. Poderia pular todas as músicas até chegar na voz da Nara, na letra do Caetano. Mas, não o fez. Queria sentir o prazer da ansiedade (aquele prazer estranho misturado com agonia e aperto no peito enquanto esperamos a chegada da pessoa amada, entende?, dizia ele para si mesmo, como se estivesse em um programa de entrevista. O entrevistador acabara de perguntar por que você, simplesmente, não vai escutar a música que você quer?). Queria saborear cada arranjo do Duprat, cada um dos sons estranhos-deliciosos dos Mutantes. E Lindonéia não fugiria dele.
Talvez seja por isso que Lindonéia tanto o atrai. Ela está ali. Todo o tempo. E de novo. Basta que ele queira. "Miss, linda, feia" e toda dele. Onde estaria aquela estúpida, agora? Ah, o que não daria para saber? Eu estou muito bem, pensou, meus discos, meus livros, o álcool, está tudo aqui. O que mais eu preciso? Nada, concluiu. Mas, ela... onde ela estará? O que estará fazendo? Quem o estaria substituindo no esconde-esconde de todas as manhãs?
Maldita estúpida. Eu não consigo lidar com você e com a pressão que o mundo coloca sobre mim. Maldita egoísta. E a pressão que o mundo coloca sobre mim, não conta? Eu gosto de você, mas, não agora. Eu queria você, mas, não agora. Mentirosa. E Os Mutantes mandando "fazer, de puro aço luminoso, um punhal, para matar o meu amor e matei". E disse isso tudo com uma desfaçatez tão grande que quase me convence que estava errado por estar no lugar certo, mas, na hora errada. Maldita + todos os adjetivos negativos que puder imaginar. Isso é o que ela é.
Ah, mas, não fica assim, fazia questão de repetir para si todas as manhãs. Estranhamente percebeu, como se lesse o que está na página agora, que repetia isso todas as manhãs. E o "todas" lhe soou muito grave. Todas as manhãs. Quantas manhãs já fazia? Pelo menos umas 60, calculou rapidamente. E se assustou com isso. 60 manhãs ouvindo Caetano e se encantando com Lindonéia?
Foi para a frente do espelho e viu as marcas roxas sob os olhos. No avesso do espelho, viu que ela estava feliz. Viajava. Vivia. Encontrava antigos amigos com os quais nunca estivera. E ele ali. Ele e Lindonéia.
Estava decidido. Não mais escutaria Lindonéia. A música estava censurada. Caetano estava liberado. Nara também. Mas, Lindonéia estava vetada. Para todo o sempre. Dirigiu-se para o som. Mas, teve tempo de ouvir Nara dizendo-lhe "sangrando, oh, meu amor, a solidão vai me matar vai me matar vai me matar de dor".
Amanhã. Talvez, amanhã eu a deixe desaparecer da minha vida. Não hoje! Hoje é dia de Lindonéia!
(Créditos da imagem: Lindonéia, a Gioconda dos Subúrbios, de Rubens Gerchman, espelho, scothilite sobre madeira. 1966)
8 comentários:
Tava lendo tua lista...
Completei a minha...
Olha só que engraçado: TEMOS ALGO EM COMUM! hahahahahahahahaha
Beijosss
FerNando Cabral, quer fazer o favor de postar mais mensagens no seu blog??? Já to que não me aguento de saudade!!!!!
Amo-te um tantãaaaaaaaaao assim!!!
Bjo, bjo e mais bjo!
Lindonéio é tu, amore!!!
Besitos!
E vê se escreve mais!
Lu
ah, mas vc nem escreve mais....
besitos! Lu
Nando, postei minha primeira lista! Atrasada? Não, imagine...
Bjks!
FerNando Cabral, apareça!!!!!!
Amo tu!
Mas aquela foto do seu perfil foi quando voc^de deu entrevista em qual programa? "Provocações"?
P.S.: Olha, agora eu já tenho blogue pra aparecer lincado!
Tenho de ler mais, acho que minha cultura está ficando no submundo biológico literário.
Ah! Férias, por que não chegas férias?!
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