terça-feira, 22 de abril de 2008

Não há contos de fadas!

Não tenho a menor pretensão, que seja, de cronista policial. Nem acho que teria talento para tanto, embora seja fã de literatura policial. Mas, tenho sido provocado a escrever sobre caso de polícia há quase um mês. Sobre um caso de polícia, especificamente. Aquele que temos sido obrigados a ver e ouvir todos os dias desde o fim de março: Isabella Nardonni.

Tenho lido bastante sobre o caso, obviamente, como todos. Esse daqui é o que mais me diz respeito, por ter sido escrito por alguém próximo. Prometi-lhe um comentário e, nada melhor que esse aqui.

O crime é bárbaro? Sem dúvida. Uma criança que é asfixiada e atirada da janela de um apartamento do sexto andar de um prédio não deveria ser concebível por nós. Simplesmente pelo absurdo que tal caso traz com ele. Já que ocorreu, um homicídio, triplamente qualificado (impossibilidade de defesa da vítima, motivo torpe e cruel) não pode ser, definitivamente, um ato comum.

Mas, eu não estou aqui para culpar ninguém. Gostaria de nem pensar em quem foi o assassino, para não cometer injustiças (embora a minha "injustiça" não vá afetar ninguém). Não é o caso. Eu penso sobre o caso, sim. E tenho uma opinião bem formada sobre o caso.

O fato de que nos deixamos comover e abalar por coisas que não nos afeta diretamente é preocupante. Não falarei sobre isso, já que o link acima já traz texto sobre isso. Concordo plenamente com ele.

Outra coisa me preocupa mais: Ana Carolina Jatobá e Alexandre Nardonni estão, desde o dia seguinte ao crime, indiciados, julgados e punidos. Isso é totalmente prejudicial. Ninguém leva em consideração que eles podem ser inocentes, como alegam. E, se for assim, havia mais alguém no apartamento. E esse alguém vai passar despercebido. Ficará solto e, quem sabe, poderá voltar a matar uma criança. Só vi uma pessoa defendendo que a polícia deve trabalhar com o improvável: Ilana Casoy.

A polícia está trabalhando com essa possibilidade? Espero que sim. O povo está? Eu já ouvi uma reconstituição completa do que teria acontecido, incluindo um acidente envolvendo Isabella, que seguraria no colo o irmão menor e o teria deixado cair, provocando a ira da madrasta que teria começado a espancá-la. Duvido que alguém tenha ouvido uma versão do crime onde a criança teria acordado enquanto o pai voltava à garagem para apanhar os outros filhos, teria flagrado alguém que poderia ter reconhecido, posteriormente, e esse alguém, para se livrar do perigo, a teria assassinado.

Fato é que julgamos o que não conhecemos. Decidimos o que não estamos aptos a decidir. E isso pode prejudicar a vida de pessoas que são inocentes. Fico me perguntando: se fosse eu, o acusado, minha mãe e minha irmã estariam defendendo a versão que a população comprou? Talvez, um dia, eu possa precisar que a justiça, a polícia e a opinião pública sejam neutras em relação a mim. Talvez, um dia, você também precise!

13 comentários:

Vitor Pimentel disse...

Esse comentário (post) valeu por todos que você não deu.

O texto é ótimo, se ultiliza de um argumento inteligente (a condenação prévia e pública de pessoas que, oficialmente não foram julgados), e, o que me deixa mais envaidecido, foi inspirado por um escrito meu.

Quase um presente!!!!

sonhos da bruna disse...

Seu texto esta fabuloso...
Eu admito que fui uma das pessoas que 'julgou e condenou' Alexandre e Ana...mas francamente, posso parecer sem coração, mas tantas fantasias e contradições...o silêncio que só foi quebrado depois da perícia técnica concluída...são mistérios...SIM...eu sei!..Mas não deixo de ter minha opinião na qual é praticamente óbivo a inexistencia de uma terceira pessoa...
Enfim, sobre teu texto está MARAVILHOSO...mas sobre Alexandre e Ana não vejo maravilha nenhuma na vida deles...como já citado por Alexandre: "Nossa vida já acabou"..

Ps.: Acho que vc iria se sair bem como advogado de defesa.

Beijos

Rafael! disse...

Existe um advogado criminalista americano muito bom de quem eu sempre esqueço o nome e o qual eu sempre cito nesses casos de "julgamento antecipado". Ele diz que a gente tem um sistema no qual a pessoa, para ser punida, tem que passar primeiro por um julgamento imparcial e ter sua culpa PROVADA. E você disse, brilhantemente, que um dia o acusado pode ser um de nós, e ninguém ia querer esse linchamento moral que estamos vendo. Costumo dizer a mesma coisa quando ouço alguém defender a violência policial ou a execução sumária de "bandidos". Invariavelmente algum idiota replica "é, direitos humanos só existem pra bandido". Ora, se a policia agir como bandido, vai chegar uma hora que não vai ter como se diferenciar dele. Mas voltando ao assunto principal, num caso como o Nardoni, além de se descobrir quem cometeu o crime, tem-se que definir qual(is) foi(ram) o(s) crime(s) e também as qualificadoras (dolo, culpa, motivo fútil, torpe, etc). Esse linchamento moral dificulta até que se faça justiça nesses detalhes, tendendo a causar a pena mais dura possível, que talevez não seja a mais justa considerando-se o que diz a lei.

sonhos da bruna disse...

Sei Fer...que o blog é seu...mais os comentários são 'nossos', não é msm?
E lendo o que Rafael escreveu..SIM, concordo em "partes" com ele...porém na parte:"(...)tem-se que definir qual(is) foi(ram) o(s) crime(s) e também as qualificadoras (dolo, culpa, motivo fútil, torpe, etc). Esse linchamento moral dificulta até que se faça justiça nesses detalhes, tendendo a causar a pena mais dura possível, que talevez não seja a mais justa considerando-se o que diz a lei."
Não vejo isso como 'dificuldade' para se definir ou considerar justa a punição para o(s) assassino(s), pois esse linchamento moral nada mais é que a resposta da SOCIEDADE perante 'montro(s)'. Como o promotor do caso afirma: "Se podemos usar a palavra "delicadamente" ao jogar uma criança na grama, para que as fraturas sejam mais leves".
Bem, então não estamos diante monstros? Pois "ele jogou" a Isabella na grama, sendo assim teve piedade.
Sabe...realmente...este sentimento tao nobre/piedoso de jogar a pequena Isabella na grama e nao no granito é comovente..Acho que os MONSTROS estamos sendo "nós" da sociedade que estamos fazendo um LINCHAMENTO MORAL dos ASSASSINOS PIEDOSOS.

Rafael! disse...

Bruna, a resposta da sociedade é natural, compreensível, e, sendo negativa, desejável. Mas uma das definições clássicas de justiça é "dar a cada um o que é seu". Não defenci que o assassino de Isabella recebesse pena maior ou menor por tê-la jogado na grama ou qualquer outra característica do assassinato, mas sim que RECEBA O QUE É SEU. O que disse e reafirmo, é que essa pressão da sociedade tende a fazer com que o júri, composto por pessoas que não são operadoras do direito, e por que não os próprios operadores do direito?, tendam a dar automaticamente a pena mais dura, mesmo que não seja o caso (lembrando que não sou grande conhecedor do direito, logo não estou apto a definir a pena do assassino).
Agora, as palavras do promotor que ele mesmo as explique.

sonhos da bruna disse...

Rafael, também não sendo uma conhecedora profunda do Dto reafirmo tb..que não tenho a mesma opinião que a sua, pois não vejo como a sociedade 'pressionando psicologicamente' o tribunal do júri p/q tenham uma pena maior ou menor..infelizmente, não pode ser constituído de operadores e estudiosos o júri popular a julgar Anna Jatobá e Alexandre Nardoni. Pois se assim fosse...ótimo seria..pois iriam ter q visão correta do tempo 'justo' para tal ato ilícito...argumentando tb q o tempo não seria de apenas 30 anos como é o tempo maximo de reclusao no Brasil...tb nao pense que sou a favor da PENA DE MORTE...mas até q nao seria 'ilicito' se algo acontecesse 'parecido' com eles na prisão. Tá,Tá! Eu sei...o Estado tem q garantir a segurança deles na prisão..."Mas durante no minimo 30 anos o Estado vai garantir isso?"
Infelizmente o tribunal de júri a julgar tamanha TROCIDADE -espero eu- que dê a pena máxima para ambos...Oooou...vc acha que mesmo q a sociedade acabe, ou mesmo que não tivesse feito/como esta fazendo/tamanha pressão...eles mereceriam uma pena mais leve???

Rafael! disse...

Bruna, a "pressão psicológica" da sociedade (que pode sempre deixar de ser psicológia e se tornar bem física -- exemplos não faltam) na sua forma mais branda chama-se opinião pública. Acho que não é exagero dizer que na sua forma mais extrema chama-se revolução. Pergunte a qualquer político, empresário, atleta, artista midiático ou qualquer "pessoa pública" o poder que a opinião pública tem.
Se o júri deveria ou não ser constituído só de leigos eu não sei. Acho que qualquer formação tem suas vantagens e desvantagem. A mais óbvia desvantagem da nossa formação, a meu ver, é que os advogados podem beneficiar-se em excesso de argumentos emocionais.
Não estou acompanhando o caso de perto, não sei quantos anos de pena os analistas acham que eles vão receber, não sei 30 anos é a pena máxima que eles podem receber considerando-se os crimes pelos quais foram indiciados. Meu senso comum de justiça me diz que eles merecem uma pena de algumas décadas, óbvio, mas essa justiça tem que passar pelas penas previstas em lei. Pouco importa se a sociedade vai fazer eles "merecerem" uma pena maior ou menos, o que importa é que a pena seja aplicada de acordo com os critérios legais, senão daqui a pouco qualquer crime tem sua pena decidida no grito.
Sobre a pena de morte tácita, é claro que o Estado não tem como garantir nem 30 segundos de segurança de ninguém numa prisão, o que é extremamente errado e, sim, ILÍCITO. Se o Estado democrático de direito é um jogo, as regras tem que ser respeitadas. Sempre.

sonhos da bruna disse...

Ambos temos opiniões completamente opostas...Acompanho o caso de 'perto'pois tem sido temas de debates nas aulas de Dto Penal e Processo Penal.
Quando afirmei "30 anos"pois este é o máximo que eles podem pagar em regime de reclusão.
Sobre 'pouco te importar' se a sociedade vai fazer com que aumente ou diminua..isso tb nao cabe a mim..pois seu 'senso comum'..pode ser equiparado ao meu, isto pq querendo ou não o juiz ou juiza a determinar a pena..não vai se basear/fundamentar aos "gritos" pois os advogados em recurso ao TJ com certeza vai apelar aos "argumentos emocionais - como vc msm afirma".
Porém AÍ SIM pouco importa ao TJ os "argumentos emocionais" "aos gritos ou nao" e sim as provas documentais..que não são poucas...
Portanto, tenho a certeza que essa "REVOLUÇÃO" da sociedade qto este caso.. não vai fazer diferença, a única diferença q pode acontecer é o desabafo que para nós seres humanos serve como um alivio perante um ato anormal/cruel...
E aos GRITOS que não vai ser baseado a sentença de Alexandre e Anna, tão pouco a senteça de qlqr delito..Pois os estudiosos de Dto aprendem desde o 1º ano de faculdade q toda ou qlqr sentença tem q ter fundamentação na CF/CC/CPC/CP/CPC...e nenhuma fundamentação "com/aos GRITOS".

sonhos da bruna disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Rafael! disse...

"pouco importa" e "no grito" seriam as citações corretas e acho pouco provável que haja uma revolução no Brasil por conta do caso em tela.
O juiz, o TJ, o Supremo, todo mundo tá sujeito a ser influenciado por argumento emocionais, embora em diferentes graus. Só imagino que os advogados de defesa são criminalistas experientes e vão usar argumentos racionais, técnicos no seu recurso.
Óbvio que ter uma pena decidida no grito e sem observância do princípio processual da exigência de motivação das decisões do juiz é um exemplo extremo que usei pra ilustrar meu ponto de vista, que é o de que precisamente isso não pode acontecer. A pena deve ser decidida com critérios racionais e previsão legal. Você diz que isso não pode acontecer, mas o judiciário é feito de humanos, e nós todos sabemos o quanto nós somos influenciáveis. Digamos que um juiz ficasse em dúvida sobre uma qualificadora, que, digamos, aumentasse a pena em dez anos, caso fosse considerada. Com todo esse pré-julgamente, ele poderia ter puro e simples medo de ser recriminado por dar uma pena dez anos menor, tudo em função da grande comoção social.
Não creio que tenhamos opiniões totalmente opostas. Não sou contra que os culpados pela morte de Isabela recebam sua pena com todo o rigor legal APLICÁVEL. Muito pelo contrário, sou totalmente a favor, desde que isso seja feito criteriosa e racionalmente.

João Victor Torres disse...

Muito bom.

N chego ao seus pés.

Regina disse...

Crime bárbaro,claro.
Mas,não concordo com o estardalhaço que se faz a respeito da morte de menina
Eu não sou insensível,não...
O mínimo de capacidade crítica levam à compreensão de que não é, não foi nem será a única barbárie cometida no Brasil.
Quantas crianças pobres e negras sofrem estupro dentro e fora de casa todos os dias?
Ah...mas isso a imprensa sensacionalista faz de conta que não existe,afinal...não dá ibope e é considerado "normal".
Como a barbárie aconteceu com uma família de classe média,estão patrocinando essa pirotecnia midiática,que já passou da conta.
Verdadeiro circo!

O que faz com que pessoas viajem quilometros e se plantem em frente ao prédio da família com faixas e cartazes?

Verdadeira lavagem cerebral!

Regina disse...

Esqueci...

O fanatismo sempre obscurece a mente.

E sobre o Estado?
O que se esperar de um Estado,onde as suas Instituições são inoperantes e lerdas em todos os segmentos?

Triste Brasil!